Vida de Pai

Arquivo : novembro 2012

O Sol já coidou, papai.
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Renato Kaufmann

As crianças querem falar certo. Elas são evolucionariamente programadas pra aprender a se comunicar, e um bebê aprende qualquer linguagem, seja chinês, hebraico, gaúcho e até a linguagem cheia de cliques sonoros dos bosquímanos do Kalahari.

Quando uma criança fala errado, não é fofo. Ela não disse aquilo para seu entretenimento – ao menos não da primeira vez. Ela está tentando aprender, e você, ao repetir a palavra errada e achando tudo de uma fofura ímpar, está atrapalhando.

Ah, quem estou enganando?
Criança falando errado é fofo pra caceta.

(A frase do título é o que a Lucia diz pra me tirar da cama nos horários mais esdrúxulos.)


Profissão: Pai
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Renato Kaufmann

Ilustração: Eduardo Souzacampus

Avaliação de currículo dos selecionados, checagem de referências e antecedentes, dinâmicas de grupo, testes, provas, exame de urina e mandar muito bem no olho no olho. Para virar pai (ou mãe), às vezes, é preciso passar por tudo isso. Outras vezes, basta um bom jantar, um vinho e esconder bem o currículo.

O trabalho não é fazer um filho, já que isso qualquer despreparado consegue. Não é à toa que dizem que pai é quem cria. Ser pai é como fazer faculdade de filosofia: é fácil de entrar, não termina nunca e você fica com mais dúvidas, e dívidas, do que quando entrou.

Seja planejada, seja uma enfartante surpresa, a paternidade só pega no tranco, com um monte de gente desabotoada empurrando, ou indo ladeira abaixo em ponto morto. Aí, põe a segunda marcha e pronto, foi. A gente pega tanto embalo que redefinimos a nossa identidade como pais de alguém. Oi, eu sou o pai da Lucia.

Na hora de reassumir as outras identidades, igualmente importantes, rola a maior culpa. Quem voltou a trabalhar depois da licença sabe bem o que é isso – culpa de estar longe, e até de sentir um pouco de alívio também.

E apesar do horário de trabalho ser péssimo e ir madrugada adentro, ter condições insalubres com aquelas fraldas atômicas, e o chefe ser meio infantil, é o melhor trabalho que você já teve.

Afinal, ele cresce a olhos vistos e você fica às vezes tão feliz que chega a ser piegas, a ponto de se ouvir falando de cada pequena conquista, cada palavra nova, cada sorriso… Nessa hora, todo cheio de ternura e ciscos no olho, não tem nunca uma boa alma pra dizer que você deveria ter parado o texto um parágrafo antes. Hmpf.


Halloween
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Renato Kaufmann

Li a notícia aqui no UOL: Criança que demonstra medo de parentes distantes deve ser respeitada. Faz todo sentido, a gente não precisa ficar forçando a barra quando um deles aparece no jantar:

– Mas papai, eu não gosto do Tio Aderbal.
– Tudo bem, filhinha, então deixe no prato e coma só as batatas.