Profissão: Pai
Renato Kaufmann
Avaliação de currículo dos selecionados, checagem de referências e antecedentes, dinâmicas de grupo, testes, provas, exame de urina e mandar muito bem no olho no olho. Para virar pai (ou mãe), às vezes, é preciso passar por tudo isso. Outras vezes, basta um bom jantar, um vinho e esconder bem o currículo.
O trabalho não é fazer um filho, já que isso qualquer despreparado consegue. Não é à toa que dizem que pai é quem cria. Ser pai é como fazer faculdade de filosofia: é fácil de entrar, não termina nunca e você fica com mais dúvidas, e dívidas, do que quando entrou.
Seja planejada, seja uma enfartante surpresa, a paternidade só pega no tranco, com um monte de gente desabotoada empurrando, ou indo ladeira abaixo em ponto morto. Aí, põe a segunda marcha e pronto, foi. A gente pega tanto embalo que redefinimos a nossa identidade como pais de alguém. Oi, eu sou o pai da Lucia.
Na hora de reassumir as outras identidades, igualmente importantes, rola a maior culpa. Quem voltou a trabalhar depois da licença sabe bem o que é isso – culpa de estar longe, e até de sentir um pouco de alívio também.
E apesar do horário de trabalho ser péssimo e ir madrugada adentro, ter condições insalubres com aquelas fraldas atômicas, e o chefe ser meio infantil, é o melhor trabalho que você já teve.
Afinal, ele cresce a olhos vistos e você fica às vezes tão feliz que chega a ser piegas, a ponto de se ouvir falando de cada pequena conquista, cada palavra nova, cada sorriso… Nessa hora, todo cheio de ternura e ciscos no olho, não tem nunca uma boa alma pra dizer que você deveria ter parado o texto um parágrafo antes. Hmpf.